Retrospectiva 2022 | N° 128 | 24.12.2022

Caros/as leitores/as,

Apresentamos uma retrospectiva de 2022, um ano com acontecimentos históricos na China, como a morte do ex-presidente Jiang Zemin e a realização do 20º Congresso Nacional do PCCh, e desafios e mudanças que marcarão os rumos dos próximos anos não só para China e a região, mas de toda a geopolítica.

Foi também um ano fundamental para a China na gestão da pandemia, com uma política de Covid Zero que teve de ser intensificada a níveis do início da pandemia, e que fechou o ano com uma flexibilização importante, mas que traz um novo desafio diante do novo surto de covid.

Esta é uma pequena seleção dos principais eventos e processos ocorridos na China em 2022. Para quem quiser se aprofundar em uma retrospectiva mais extensa, pode acessar os arquivos completos de nossos boletins aqui.

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Boas festas e um bom começo de 2023 a todos!


Geopolítica

Do conflito Rússia-Ucrânia ao avanço em espaços como o BRICS e Organização de Cooperação de Xangai (OCX), a China continuou firmando seu papel fundamental na geopolítica. Antes da crise entre Rússia e Ucrânia eclodir, o presidente russo Vladimir Putin foi recebido por Xi Jinping em Pequim às margens dos Jogos Olímpicos de Inverno. Após o encontro, ambos lançaram um comunicado conjunto, reiterando que “a amizade entre os dois Estados não tem limites, não há áreas que estejam ‘excluídas’ da cooperação”.  Na declaração conjunta os países se opõem à expansão da OTAN, à independência de Taiwan e expressam preocupação pela criação da AUKUS.  Desde o início da “operação militar especial” na Ucrânia, Xi defende uma saída política à crise através do diálogo, visando a paz. Em meio às sanções impostas à Rússia pelo Norte Global, em maio as importações chinesas de petróleo bruto russo subiram 55% em relação ao ano anterior, atingindo um nível recorde, e desbancando a Arábia Saudita como principal fornecedor. No mesmo período de comparação, as importações chinesas de gás natural liquefeito (400 mil ton) da Rússia saltaram 56%.

[Xinhua]

Ainda em maio, a China criticou a política de resposta à crise na Ucrânia através de sanções e fornecimento de armas à Ucrânia, durante a reunião de chanceleres dos BRICS. Nessa reunião, Xi reafirmou a necessidade de resistir à mentalidade de Guerra Fria e fortalecer cooperação entre os países em desenvolvimento. Em junho, a China sediou a XIV Cúpula do BRICS, que debateu a construção de alternativas financeiras ao dólar, como um mecanismo internacional baseado em uma cesta de moedas. Uma outra notícia da cúpula foi a candidatura oficial do Irã e da Argentina para se unirem ao bloco.

14ª Cúpula do BRICS presidida por Xi Jinping, 23 de junho de 2022 | Xinhua

Outra importante cúpula realizada em 2022, foi a da Organização de Cooperação de Xangai (OCX), em setembro, que também teve avanços em termos de expansão, com a entrada do Irã como novo membro, Arábia Saudita, Catar e Egito tornando-se parceiros de diálogo e Bielorrúsia iniciando processo de adesão. Na reunião, a Turquia anunciou interesse em integrar a OCX, o que significaria a entrada pela primeira vez de um membro da OTAN na entidade.


O acirramento das tensões entre as duas maiores potências econômicas do mundo marcaram 2022, apesar de um primeiro encontro cara a cara, já perto do final do ano, entre Xi Jinping e Joe Biden. Em agosto, a presidenta do Congresso dos EUA, Nancy Pelosi, contrariou advertências e críticas do governo chinês e realizou uma viagem a Taiwan, no que foi visto como uma ameaça à base das relações sino-estadunidenses. Em outubro, os EUA anunciaram novas políticas de bloqueio contra a indústria de semicondutores chinesa. Norte-americanos estão encontrando resistência de outros países a se somarem à política de boicote à China.

Política Nacional

O momento mais aguardado do ano foi o 20° Congresso Nacional do Partido Comunista da China (PCCh). Em relatório apresentado ao congresso, Xi Jinping destacou as conquistas econômicas dos últimos 10 anos, com PIB chinês passando a representar 18,5% da economia mundial, ressaltou a eliminação da extrema pobreza e anunciou que o país deverá melhorar a distribuição de renda.

Xinhua

Xi foi eleito secretário-geral do Comitê Central do PCCh e o 20º Congresso Nacional fez uma emenda à Constituição do Partido destacando o papel central de Xi Jinping e seu pensamento. O congresso fez revisões sobre princípios e objetivos como os de prosperidade comum, socialismo com características chinesas para uma nova era, fortalecimento das Forças Armadas, desenvolvimento da democracia popular integral, a meta do segundo centenário, de tornar a China um grande país socialista moderno em todos os aspectos, e a oposição à “independência de Taiwan”.


Outro destaque do congresso foi a ênfase dada ao modelo de modernização da China como alternativa à modernização ocidental, dominada pelo capitalismo e baseada em guerras, saques e colonização. O relatório do 20º Congresso afirmou que o modelo de modernização chinês tem base no desenvolvimento pacífico, socialista e centrado no povo.

SCMP

O ano de 2022 trouxe a maior queda em 24 anos na fortuna dos bilionários na China (18%), assim como uma redução de 11% no número dos mesmos. O fenômeno foi impulsionado, em grande parte, pelo fraco desempenho do mercado imobiliário. Tanto esse setor como o das Big Techs vem sendo objeto de regulamentações que visam, por exemplo, reduzir a especulação imobiliária e aprimorar a legislação antimonopólio, no caso do setor tecnológico.

Ao mesmo tempo, um dado divulgado em novembro mostrou que em 2021 o número de famílias chinesas de “alto patrimônio líquido”, que inclui aquelas com mais de 10 milhões de yuans (R$ 7,3 milhões), aumentou 1,9%, chegando a quase 2,1 milhões. Como parte da campanha de erradicação da pobreza, o governo decidiu recentemente ampliar assistências a 63 milhões de pessoas de baixa renda. Ainda em abril, o governo também anunciou investimentos de pelo menos R$ 10,84 trilhões, com mais da metade voltada para apoiar as indústrias e serviços, como fábricas, parques industriais, incubadoras de tecnologia e parques temáticos, e cerca de 30% dos projetos para infraestrutura tradicional, como estradas e ferrovias. 


Em relação ao combate à covid-19, logo no final de fevereiro a China enfrentou seu pior surto desde o início da pandemia, desta vez em Xangai, o que levou a maior cidade da China a um lockdown de 2 meses. Já finalizando o ano, o governo começou a flexibilizar as medidas da estratégia de Covid Zero dinâmica, deixando de realizar testes PCR em massa e de exigir resultados negativos para circulação em prédios, transporte público e viagens inter-regionais. Algumas das principais cidades, especialmente Pequim, encerram o ano enfrentando novos surtos. O governo buscará vacinar 90% das pessoas com mais de 80 anos até o final de janeiro.

Xinhua

Economia

Em 2022, a economia chinesa enfrentou grandes desafios pelos surtos de covid  e um contexto internacional marcado por tensões econômicas e geopolíticas, como a crise na Ucrânia. Isso deve fazer o crescimento econômico ficar abaixo da meta de 5,5% do governo chines.

Nesse marco, a China continuou desenvolvendo esforços para resistir à hegemonia do dólar estadunidense. Em meados do ano, o Banco Central da China assinou um acordo com o Banco de Compensações Internacionais (BIS, na sigla em inglês), com sede na Suíça, para criar fundo de reservas de yuans com os bancos centrais da Indonésia, Malásia, Hong Kong, Cingapura e Chile, que participam do acordo. Cada país contribui com um mínimo de 15 bilhões de yuans (R$ 11,76 bilhões) e tem o direito de acessar o fundo em caso de volatilidade do mercado, dispensando o uso da moeda estadunidense. Em abril, o yuan se tornou a quinta moeda mais negociada do mundo.

As tensões com os norte-americanos somadas à taxa de inflação mais alta nos EUA em 40 anos (9,1%), fizeram com que os títulos da dívida estadunidense em poder da China caíssem para menos de US$ 1 trilhão pela primeira vez em mais de 12 anos, ficando em US$ 980,8 bilhões.
Este ano, pela primeira vez, as receitas de companhias chinesas (R$ 59,86 trilhões) superaram as das estadunidenses (R$ 57,97 trilhões) na lista da Fortune Global 500. As empresas estatais tiveram um papel importante no feito. A China teve listada 3 gigantes estatais energéticas (State Grid, CNPC e Sinopec) entre as 5 maiores companhias do mundo, e a maioria das empresas chinesas na lista (87 de 145) são majoritária ou totalmente estatais. A China criou a China Mineral Resources Group, uma gigante estatal de minério de ferro de R$ 15,6 bilhões para fortalecer sua posição no comércio global do setor.

CFP

A fabricante chinesa de veículos BYD, entrou na lista pela primeira vez, ocupando a 436ª posição com uma receita de R$171 bi. No 1° semestre, a companhia também conseguiu a façanha de desbancar a liderança da Tesla, de Elon Musk, em vendas globais de veículos elétricos. Além disso, esse ano a China superou a Alemanha, e se tornou a segunda maior exportadora de carros do mundo, ficando apenas atrás do Japão.

Já o setor imobiliário, um dos mais afetados pela pandemia, passou a maior parte do ano sob contração, começando a dar sinais de recuperação no último trimestre. Entre janeiro e setembro, transações de terrenos das 100 maiores incorporadoras (R$ 779 bilhões) acumularam queda de 51,2% interanual. No entanto, o aumento de 130,2% no valor das compras de terrenos das 50 maiores incorporadoras imobiliárias em setembro trouxe esperança ao setor.

VCG

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Agricultura e Meio Ambiente

Em 2022, a China foi atingida por ondas de calor e inundações que apresentaram desafios para a agricultura do país. Em agosto, foi registrada a onda de calor mais intensa desde que a China iniciou observações meteorológicas em 1961, impactando na geração de energia e nas colheitas de outono. O governo destinou R$ 150,9 milhões em fundos de socorro a desastres para ajudar no alívio da seca.


Apesar das condições climáticas adversas, a China conseguiu superar, pelo oitavo ano consecutivo, a meta de colheita anual de 650 milhões de toneladas de grãos, chegando a ter inclusive um crescimento interanual de 0,5%, graças ao aumento de terras cultivadas.

Xinhua

Este ano, o governo começou a incentivar agricultores a cultivarem uma nova variedade de arroz, que pode ser colhida por vários anos sem replantio, chega a render 15 toneladas/ha (2018) e reduz pela metade os custos de produção. Ao mesmo tempo, a produção de uma variedade de arroz que cresce em solo salgado e alcalino mais que dobrou em três anos, aumentando a produtividade para mais de 10 toneladas/hectare em 2022. A China é a maior produtora e consumidora de arroz no mundo.


No primeiro semestre de 2022, as vendas das cooperativas de abastecimento e comercialização rurais aumentaram 19,1% para mais de 2,94 trilhões yuans (R$ 2 trilhões), com a ajuda do comércio eletrônico. Está ocorrendo um ressurgimento dessas cooperativas, como parte do programa de revitalização rural e de redução da pobreza. Hoje elas somam 37.652, com quase 400 mil pontos de venda em todo o país.

Xinhua

Um estudo publicado este ano pela Universidade de Chicago, revelou que, em sete anos, a China conseguiu reduzir quase o mesmo nível de poluição do ar (40%) que os EUA levaram para diminuir em três décadas. Se a tendência for mantida, pode acrescentar cerca de dois anos à expectativa de vida média no país, segundo a pesquisa.

Ainda em relação ao meio ambiente, outro estudo publicado no início do ano, e realizado pelo Grantham Research Institute on Climate Change and the Environment e a Energy Foundation China, mostrou que a China é líder global em capacidade instalada de energia solar (39% do total) e eólica (36%), mas que ainda precisará avançar para cumprir metas de transição para energia limpa.

 Ciência e Tecnologia

A China realizou importantes avanços e conquistas em ciência e tecnologia em 2022. Pela primeira vez, o país superou os EUA em número de artigos científicos mais citados, e tornou-se líder global. Entre o 1% dos papers mais citados no mundo, considerados de maior qualidade, 27,2% (4.744) são chineses e 24,9% (4.330) são estadunidenses. A China também continua liderando em total de artigos publicados, 407.181, superando os EUA que se mantém em segundo lugar com 293.434.


Em junho, a China lançou o Type-003 Fujian, seu primeiro super porta-aviões com sistema eletromagnético, que aumentou a capacidade de transporte de 30 para mais de 60 aeronaves. Trata-se do primeiro porta-aviões não estadunidense a rivalizar com os similares Ford e Nimitz da Marinha dos EUA, e é capaz de suportar mais de 80 mil toneladas. O feito foi um passo importante no objetivo da China de fazer sua Marinha operar em pé de igualdade com a dos EUA até 2050.

CCTV

O governo aprovou uma Lei de Algoritmos que visa conter a influência das Big Techs na opinião pública e proteger trabalhadores das plataformas de serviços. O abuso no uso de algoritmos é visto no país como ameaça aos direitos dos consumidores e trabalhadores, e à segurança nacional. 

Cultura e Vida do Povo

Mais de quatro décadas após estrear nos Jogos Olímpicos de Inverno, a China sediou o evento pela primeira vez e bateu seu recorde de participantes, com 176 atletas. A esquiadora de origem chinesa nascida nos EUA, Gu Ailing, ganhou seu primeiro ouro olímpico pela China em meio a acusações de “traição” por parte da mídia estadunidense. “Esportes devem ser usados para unir os seres humanos”, disse Gu, cuja vitória recebeu 670 milhões de visualizações e comentários nas redes.

Gu Ailing | Xiao Yijiu – Xinhua 

A expectativa média de vida na China subiu de 77,9, em 2020 para 78,2 anos, em 2021, superando pela primeira vez a dos EUA, que caíram de 78,9, em 2019, para 76,6 em 2021, segundo dados divulgados em julho pela Comissão Nacional de Saúde.

Segundo o levantamento da entidade, as mortalidades materna (16,1/100.000) e infantil (5/1.000) na China caíram para um mínimo histórico, e o investimento em saúde atingiu 6,5% do PIB.

Uma pesquisa publicada pela revista científica sobre medicina The Lancet mostrou que os jovens de 13 anos na China rural se tornaram 7,5 cm mais altos e 6,6 kg mais pesados ​​do que os jovens da mesma idade de uma década atrás.

Graças a uma melhoria nutricional iniciada em 2012, como parte do programa de redução da pobreza, o aumento médio das crianças dos 6 aos 15 anos foi de 3 cm e 1 kg.

Esse ano, pesquisas revelaram que mais de 200 milhões de chineses trabalham por conta própria. Segundo os dados, em 2021, 16% dos recém-formados — que em 2022 atingirão o recorde de 10,76 milhões — começaram a trabalhar de forma independente.

People’s Daily Online / Zhang Guorong

Cada vez mais jovens estão optando por trabalhar em vilarejos rurais ou comunidades de base, com incentivos do governo e das universidades, face ao aumento do desemprego, que atinge 18,7% dos jovens. Segundo a TV estatal chinesa, nos últimos três anos, 70% dos formados nas universidades conseguiram empregos em pequenas cidades e áreas rurais, e 60% escolheram trabalhar nas regiões menos desenvolvidas do país, apoiando projetos de revitalização rural.


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