N.º 35 | 06.03.2022
Zhang Jun, representante permanente da China junto à ONU, pediu à comunidade internacional que utilizasse o diálogo e a consulta para buscar uma solução abrangente para a questão da Ucrânia. [Foto da ONU]

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A guerra russo-ucraniana: O papel da China na construção de uma nova ordem internacional
Zheng Yongnian
Zheng Yongnian (郑永年) é diretor do Instituto Avançado de Estudos Globais e Contemporâneos da China, Universidade Chinesa de Hong Kong (Shenzhen)

Contexto

A guerra russo-ucraniana que eclodiu em fevereiro de 2022 vem sendo objeto de um debate sem precedentes em toda a China, graças, em parte, às vozes ativas das embaixadas russas, ucranianas e de outros países europeus nas plataformas das mídias sociais chinesas. Zheng Yongnian analisa a guerra russo-ucraniana no contexto do colapso da velha ordem internacional formada após a Segunda Guerra Mundial, e a incubação de uma nova, na qual a China tem um papel a desempenhar.

Pontos-chave

  • A ordem internacional formada após a Segunda Guerra Mundial vem colapsando rapidamente. A crise na Ucrânia reflete a reorganização e a colisão de várias forças no âmbito da frágil e velha ordem internacional em ascensão de políticos poderosos em um mundo plural.
  • Embora a expansão da OTAN para o leste tenha levado à atual guerra russo-ucraniana, a própria Ucrânia desempenhou um papel importante para esse desfecho, na medida em que seus políticos confiaram sua segurança ingenuamente na OTAN e nos Estados Unidos, ao passo em que seus intelectuais postulavam a construção de uma "nova nação" de acordo com os valores ocidentais.
  • Após a desintegração da antiga ordem da Guerra Fria, a nova ordem internacional se desenvolve ao longo de duas linhas principais: A Rússia, que se encontra em crise devido à expansão da OTAN para o leste, e a China, que está crescendo e sendo contida pelos EUA.
  • Embora não seja provável que os EUA enviem tropas para a Ucrânia, os Estados Unidos perceberam que Putin e a Rússia não devem ser subestimados. Dessa forma, esse fenômeno pode vir a retardar significativamente o deslocamento das prioridades estratégicas dos Estados Unidos da Europa para a região Indo-Pacífico.
  • A resposta da OTAN à guerra russo-ucraniana, liderada pelos Estados Unidos, sugere que estes não são mais capazes de manter uma ordem internacional de uma única potência, e que a nova ordem internacional está se aproximando do pluralismo.
  • A nova ordem internacional emergente reflete uma maior dispersão de riqueza, poder e autoridade cultural, sem superpoderes, apenas grandes países e potências regionais.

Resumo

O autor argumenta que a guerra russo-ucraniana conduziu a conjuntura internacional, e que a China precisa analisar com serenidade as novas mudanças e tendências na interação das grandes potências. Não é impossível que a Rússia amplie sua presença na Ucrânia e crie um império russo para defender sua segurança nacional. Para garantir que o processo de modernização da China não seja interrompido pelos Estados Unidos, é preciso evitar erros de cálculo estratégicos e decisões impulsivas. Um importante atributo de um grande país é sua responsabilidade de promover e manter a paz internacional. A China pode desempenhar um papel mais importante na construção de uma nova ordem internacional.

As sanções financeiras dos EUA contra a Rússia não vão funcionar
Chen Jing
Chen Jing (陈经) é vice-presidente da Sociedade para a Ciência, Tecnologia e Tendências Estratégicas

Contexto

Em 26 de fevereiro, dois dias após a Rússia ter iniciado sua operação militar na Ucrânia, os EUA e seus aliados europeus anunciaram que os bancos russos teriam a utilização do sistema de liquidação SWIFT suspenso. Chen Jing acredita que as sanções contra a Rússia não têm precedentes e que suas atividades comerciais internacionais serão significativamente restringidas. Entretanto, o exemplo iraniano mostra que o país encontrou maneiras de sobreviver após ter sido bloqueado do sistema SWIFT em 2012.

Pontos-chave

  • Desde março de 2014, o Ocidente vem impondo várias rodadas de sanções à Rússia, mas os ataques econômicos não vinham sendo contundentes. Em contraste, o objetivo das sanções mais recentes é causar o colapso econômico e a instabilidade política no país.
  • Como a União Europeia (UE) concordou voluntariamente em utilizar o SWIFT para sancionar a Rússia, é muito possível que as atividades comerciais globais do país sejam prejudicadas, e que este passe a buscar meios alternativos para conduzir o comércio global.
  • A UE importa 41% de seu gás natural da Rússia, de forma que esta poderia negociar uma isenção de sanções em matéria de energia com os EUA e a Europa, mas isso representaria uma saída humilhante. Além disso, a dependência de isenções para manter as exportações de energia não consiste em uma solução a longo prazo.
  • Apesar das sanções dos EUA contra o Irã, a Índia está considerando comprar petróleo iraniano em Rúpias, ao passo em que também a China e a UE também vêm tentando fazer negócios com o país, contornando o SWIFT. Da mesma forma, a Rússia também tem desenvolvido o SPFS, na hipótese de ser expulsa de tal sistema.
  • A China e a Rússia acabam de assinar um acordo de gás com vigência de 30 anos a ser liquidado em Euros; se o sistema SWIFT não puder ser empregado, as partes poderão liquidar suas obrigações em RMB ou em moedas bilaterais. Dessa forma, mesmo que os EUA mantenham as sanções sobre o SWIFT, a China não sofrerá maiores consequências.
  • As sanções dos EUA e da Europa podem levar China, Rússia e Irã a formarem uma aliança "anti-sanções". Juntamente com o Sul da Ásia, Sudeste Asiático, Ásia Ocidental e África – uma população de quase 6 bilhões de habitantes – ela se tornaria a aliança mais forte do mundo. Os EUA e a Europa, mais a Austrália, Nova Zelândia, Japão e Coreia do Sul – um total de apenas 1 bilhão de pessoas – não podem representar o mundo.

Resumo

De acordo com Chen Jing, as sanções econômicas impostas pelos EUA e Europa causarão um golpe na economia russa a curto prazo, mas, a longo prazo, contrariamente, conduzirão à formação de um sólido triângulo de cooperação regional entre a China, a Rússia e o Irã na Eurásia. Os países em desenvolvimento, em geral, podem contornar a interferência e a exploração comercial desigual dos EUA e da Europa e alcançar um rápido desenvolvimento econômico caso venham a se integrar ativamente na estrutura de cooperação sino-russo-iraniana.

Equívocos sobre a “distribuição terciária” para alcançar a prosperidade comum
Wang Shaoguang
Wang Shaoguang (王绍光) é Professor Emérito do Departamento de Governo e Administração Pública da Universidade Chinesa de Hong Kong

Contexto

A China está empenhada em alcançar a meta de prosperidade comum para toda população até 2050. Na primeira da série de duas partes, Wang Shaoguang explicou o papel especial da "distribuição pré-primária" (零次分配 líng cì fēnpèi) na China e enfatizou que a distribuição primária desempenha um papel maior do que a distribuição secundária na redução da desigualdade de renda no contexto chinês. Nessa segunda parte, Wang se concentra nos equívocos sobre a “distribuição terciária” (三次分配 sāncì fēnpèi) – reduzir a disparidade de riqueza por meio de doações – tecendo uma comparação internacional.

Pontos-chave

• O conceito de "distribuição terciária" foi proposto pelo economista Li Yining (厉以宁), o qual acredita que esta se baseia no poder da moralidade e no compromisso individual. Equivalente à "caridade" em outros países , trata-se da distribuição voluntária de recursos e riqueza sociais por grupos de alta renda por meio de angariação de fundos, doações e subsídios.

• A filantropia tem sido historicamente utilizada pelos ricos para mostrar seu status e posição "nobres", embora seu escopo e intensidade sejam pequenos; hoje em dia, a caridade é frequentemente acompanhada por incentivos fiscais e outras políticas preferenciais do governo, e é difícil controlar o fluxo de doações. Portanto, seu efeito redistributivo é, de fato, mínimo.

• Existem dois equívocos sobre doações beneficentes: a primeira falácia é que quanto mais rica a pessoa, maior a sua doação. Na verdade, a taxa de dedução fiscal é mais alta para pessoas de alta renda. Nos Estados Unidos, as deduções fiscais para contribuições de caridade totalizaram US$ 54,1 bilhões em 2018, dos quais 56,4% foram para os bolsos dos 1% das famílias mais ricas.

• A segunda concepção errônea é que as doações beneficentes destinam-se principalmente às pessoas de baixa renda. Nos Estados Unidos, por exemplo, os maiores beneficiários das doações são as igrejas e clérigos (40%), sendo que menos de um décimo vai para os pobres.

• Os doadores privados decidem como usar suas economias após a dedução de impostos, e muitas vezes o dinheiro flui na direção oposta das metas de distribuição secundária definidas pelos governos. Comparando a política de distribuição e a disparidade de renda, os Estados Unidos, que possuem os três sistemas de distribuição mais fortes, têm maior disparidade de renda do que o Canadá, a França e a Dinamarca.

Resumo

Wang conclui, com base nas conclusões acima, que a distribuição terciária pode ser apenas um meio suplementar para alcançar a prosperidade comum. A China é orientada pelo Socialismo científico, e deveria perseguir firmemente os valores comunistas da emancipação humana e do desenvolvimento integral dos seres humanos. A prosperidade comum não será alcançada da noite para o dia, mas pode contribuir de maneira constante para o desenvolvimento das forças produtivas do país.

O alívio da pobreza e a transformação ecológica da China sob o Novo Sistema para Toda a Nação da China
Wen Tiejun
Wen Tiejun (温铁军) é especialista em questões rurais da China e decano executivo do Instituto de Reconstrução Rural da China, Universidade do Sudoeste

Contexto

Em um documento publicado recentemente, o governo chinês se compromete a consolidar as conquistas da erradicação da pobreza extrema e a promover de forma abrangente a estratégia de revitalização do campo. Wen Tiejun aponta que, no processo de globalização, desde a expansão colonial da industrialização europeia, os países capitalistas repassaram os custos de desenvolvimento aos países em desenvolvimento, o que resultou em que estes passassem à “pobreza sistêmica”. Em contraste, na China, graças ao Sistema para Toda a Nação (举国体制 jǔguó tǐzhì), liderado pelo Partido Comunista, o país tem eliminado a pobreza, refletindo as vantagens do Socialismo com Características Chinesas.

Pontos-chave

• Sob o Sistema para Toda a Nação da China, o governo central redireciona diretamente recursos, como capital e tecnologia, para o campo. As medidas não apenas ajudam a reduzir a pobreza, mas também aliviam a crise de superprodução causada pelo declínio da demanda externa.

• O sistema capitalista ocidental transfere problemas para os desprivilegiados, causando sério risco à instabilidade social e problemas de segurança nacional. O alívio da pobreza na China tem se consolidado como uma experiência importante na salvaguarda dessas variáveis.

• Por mais de meio século, a contribuição da China para o alívio da pobreza vem se convertendo em uma conquista institucional abrangente. A “estratégia de civilização ecológica” de 2013, que visava ao desenvolvimento inclusivo e sustentável, também pode ser aplicada a países em desenvolvimento do mundo inteiro.

• Em meio à "guerra climática" de Biden contra a China, e à transição estratégica do país asiático para uma civilização ecológica, o desenvolvimento de uma economia ecológica é um passo importante na jornada para a revitalização rural.

• Se a economia digital e a economia ecológica forem combinadas e implementadas no desenvolvimento verde do campo, isso poderia evitar o fluxo de capital financeiro para fora da economia real.

• Os recursos ecológicos são bens públicos e não podem ser precificados pelo mercado. Assim, seus principais desenvolvedores deveriam ser organizações econômicas coletivas que possam beneficiar os camponeses.

Resumo

Wen Tiejun afirma que a revitalização do campo não deve seguir o caminho da modernização agrícola dos países capitalistas, a qual exige apenas o aumento da produção agrícola. Em vez disso, a revitalização deve ser associada à estratégia de civilização ecológica para fomentar o desenvolvimento. É necessário estabelecer um sistema de avaliação desse processo a partir do Socialismo com Características Chinesas.

O Movimento de Estudos de Filosofia em Yan’an e a sinicização do Marxismo
Li Donglang
Li Donglang (李东朗) é professor no Departamento de História do Partido, Escola do Partido do Comitê Central do Partido Comunista da China

Contexto

Depois que a Longa Marcha do Exército Vermelho chegou ao norte de Shaanxi, em outubro de 1935, os comunistas chineses estabeleceram sua base revolucionária em Yan'an, onde permaneceram no poder por 13 anos. Os comunistas saíram do cerco devastador do Kuomintang (KMT) e avançaram para cooperar com este na luta contra a invasão japonesa. Durante esse tempo, Mao Zedong buscou na Filosofia uma metodologia para obter uma melhor compreensão e transformação do mundo, a fim de fazer avançar a causa da Revolução Chinesa. Sob sua liderança e organização, o estudo da Filosofia em todo o Partido teve início. Segundo Li Donglang, esse movimento teve um impacto importante na construção teórica do Partido, e contribuiu para o processo de sinicização do Marxismo, como proposto pela 6ª Sessão Plenária do Sexto Comitê Central do PCCh.

Pontos-chave

• Embora a rotina diária de Mao Zedong fosse interrompida pelas brutalidades da guerra, ele insistia no estudo de questões filosóficas, o que era raro na história chinesa e mundial. Isso demonstra a importância que Mao atribuía à construção teórica do PCCh.

• De acordo com a análise de Mao em 1937, os erros “esquerdistas” do Partido durante os 15 anos anteriores resultaram da não popularização do materialismo dialético no Partido.

• Orientado pelo materialismo dialético e histórico, Mao escreveu Problemas de Estratégia na Guerra Revolucionária da China (中国革命战争的战略问题 Zhōngguó gémìng zhànzhēng de zhànlüè wèntí), que analisava os erros dos oportunistas “esquerdistas” e daqueles que estavam agindo cegamente. Escreveu também Sobre a Prática (实践论 Shíjiàn lùn) e Sobre a Contradição (矛盾论 Máodùn lùn), que resumiram a experiência histórica da Revolução Chinesa. Em Sobre a Guerra Prolongada (论持久战Lùn chíjiǔ zhàn), ele chegou à conclusão correta de que "a guerra contra o Japão é uma guerra prolongada" e que "a vitória final será da China".

• Antes da realização da Conferência Zunyi (1935), a ideologia errônea caracterizada pelo Marxismo dogmático e pela mímica da experiência soviética já existia há muito tempo dentro do Partido. O objetivo da convocação de Mao para que a Filosofia fosse estudada era eliminar os erros dogmáticos na frente ideológica, dizendo que, "se queremos nos opor ao pensamento subjetivo, devemos propagar o materialismo dialético".

Resumo

Nos estágios iniciais após sua fundação, a preparação teórica do PCCh era insuficiente, resultando parcialmente em políticas erradas adotadas pelo Partido durante a Grande Revolução Chinesa (1925-1927) e a Guerra da Revolução Agrária (1927-1937). O estudo da Filosofia proposto por Mao ajudou a preparar teoricamente o Partido para estabelecer a linha ideológica de "buscar a verdade a partir dos fatos" e, ao mesmo tempo, elevou fortemente o nível teórico dos membros e quadros do Partido, conduzindo, assim, à vitória da resistência anti-japonesa e da libertação nacional. A profunda formação teórica de Mao também ajudou a aumentar significativamente seu prestígio dentro do Partido. Essa bela tradição do PCCh de dar importância ao aprendizado teórico formou-se ao longo desse período, e continua até os dias de hoje.

(O “Vozes Chinesas” continuará a interpretar o contexto histórico e a lógica de desenvolvimento da sinicização do Marxismo)

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